A Fase mais Escura





Dizem que a noite é mais escura antes do nascer do Sol. Devo ter visto isso em um filme ou em uma previsão do tempo. Não me recordo. Seja como for, achei poético e usei a citação. 

Tive uma semana horrível e libertadora. 

Há um mês fui convidada a participar de um ritual de finalizações com a Deusa Hindu, Kali. Como adoro um misticismo, não pensei duas vezes. 

Conhecia pouco sobre ela. Kali é uma deusa hindu associada à transformação, morte, renascimento e poder feminino. Ela é uma das formas da deusa Durga e é frequentemente retratada como uma figura feroz e poderosa.

Na mitologia hindu, Kali é descrita como uma deusa de aparência assustadora, com uma expressão selvagem, cabelos desgrenhados e uma língua estendida. Ela é retratada como negra ou azul-escura, com várias mãos, cada uma segurando um objeto simbólico, como uma espada, um tridente, uma cabeça decepada e um recipiente que contém o sangue das vítimas. Ela é frequentemente retratada dançando sobre seu marido, Shiva, que representa o aspecto masculino do universo.

No meu texto inaugural desse blog falei sobre Renascimento. A carta Morte do Tarot (que eu também jogo para mim mesma e para poucos amigos próximos) traz muito medo para as pessoas. Ela não simboliza a morte em si, mas a finalização de uma idéia,, de um ciclo, de uma situação que, por consequência, irá abrir as possibilidades para um renascimento mais próspero. Kali é a própria Morte. Porém, ela nunca tinha me assustado, até agora. Sempre vi A Morte como Renascimento e isso sempre era bom. 

Domingo passado precisei verificar dois processos de clientes que se encontram protocolados na prefeitura de São Paulo há três anos. A arquitetura e a engenharia representa uma fase da minha vida em que eu fiz 90% das escolhas erradas. Ao entrar na plataforma eu "buguei". Tive um branco, uma tremedeira, vomitei e não consegui controlar meu próprio corpo por um período assustador. Já tive ataques de pânico, mas esse foi algo completamente diferente. 

Na terapia, foi decidido que o mais inteligente a fazer era me afastar de vez dessa carreira que me dá tantos gatilhos para proteger minha saúde.

Lembrei novamente de Kali. Ela é conhecida por sua ferocidade e capacidade de destruição, simbolizando o poder do tempo, da morte e da mudança. Ela é considerada a destruidora do mal e da ignorância, e muitas vezes é invocada para destruir obstáculos e proteger os devotos. Sua dança representa a dança cósmica da criação, preservação e destruição do universo.

A escolha de cursas arquitetura foi um plano B. Amava o cinema, mas meu desespero para poder me tornar independente me fez escolher uma carreira que me ancorou em um jogo de propina, de desvios de verba, de corrupção e de pessoas sem escrúpulos. 

Não tive um trabalho em que não esbarrava em uma atitude moralmente duvidosa pela tangente. Na construtora lembro do assédio do engenheiro chefe que me causava ataques de pânico escondidos nas escadas com cimento fresco. Meu ex-marido (Graças a Deus!) escondia desvios de dinheiro dos clientes e acumulava obras sem terminar. Descobri tudo quando estava grávida e o estresse culminou em uma pré-eclâmpsia grave.  Fui trabalhar em um escritório de arquitetura que estava envolvido no escândalo da máfia do ISS. Quando decidi me virar sozinha, peguei projetos para aprovar nos órgãos públicos, porém, a morosidade de anos só é remediada com uma 'ajuda extra' que eu nunca tive estômago para acatar. 

Embora Kali seja associada à violência e ao caos, seu propósito é restaurar o equilíbrio e a ordem no universo. Ela é reverenciada como uma deusa maternal e protetora, capaz de conceder bênçãos e liberar seus devotos das amarras do ego e da ilusão.

Kali, em seu ritual, plantou a semente do renascimento. Eu pulei de cabeça. Repassei meus projetos para outros colegas competentes e espero colher doces frutos dessa decisão. 

Pedi para zerar a vida e dar um belo restart. Faço esse pedido há anos. 

Essa semana tive pânico, medo, ansiedade e crises de choro. Meu ego estava abalado, afinal desistir não é o que eu aprendi. Porém, tenho que admitir que a engenharia foi uma grande ilusão, que, ao invés de me libertar, apenas me enterrou em um lugar que eu não nasci para estar. 

Quem é artista sabe onde é o seu lugar.

Hoje estou vendo um nascer do sol. Uma leve claridade no horizonte. Mal posso esperar quando essa luz me iluminar e mostrar quem eu realmente sou. 

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