Profissão: Influencer







Hoje li a coluna de Ronaldo Lemos e não poderia deixar de comentar algo que, pra mim, é óbvio desde que tirei minha carteira de trabalho. Talvez porque cresci tendo Seu Madruga como um herói, ou porque nunca me dei bem com nenhum tipo de reunião social por muito tempo (escola, faculdade, ballet e por aí vai...). Muito antes de existirem os Bloggers e Youtubers, eu já via o trabalho como uma penitência da vida adulta. 

Segundo a coluna, os motivos da geração dos Millenials (a minha) escolher ser Influenciadores são o dinheiro e horários flexíveis. Já a geração Z, acredita que dessa forma podem mudar o mundo (coitados, são novinhos ainda). 

É fato que a saúde mental dos Influenciadores vai para o espaço com a quantidade de trabalho a ser feito que vai de encontro as expectativas de uma vida luxuosa imediata. Mas, antes de criticar essa expectativa x realidade, quero dizer como o mercado de trabalho tradicional (imperador supremo pré-covid) destruiu todas as minhas esperanças de felicidade e talvez seja o mesmo que impulsiona esses jovens a evitá-lo como baratas de esgoto. 

Vamos combinar que a nossa geração não gosta de receber ordens. A geração de nossos pais aparentava uma realidade bem definida, com trabalho das 8h as 18h, por 30 anos, uma legislação aparentemente interessante como a CLT e a certeza de uma aposentadoria em que seria possível se organizar o suficiente para por as barbas de molho. 

Foram tempos que, com trinta anos de idade, um casal já conseguia uma casa própria quitada (sem serem ricos. Era algo alcançável para a classe média), um carro e talvez uma viagem para a praia a cada dois meses. Conseguiam ter comida na mesa, contas pagas e filhos na escola. Não viviam como reis, mas conseguiam garantir o básico da sobrevivência. E, em nome dela, até aguantavam alguns chefes escrotos e encontravam conforto fazendo a contagem regressiva para o dia em que se aposentariam. 

Com trinta anos, a maioria dos jovens hoje conquistaram uma samambaia. Se forem de classe média alta, um gato. Os que não possuem visão financeira tiveram filhos e precisam contar com a ajuda dos avós para criá-los, afinal, babá custa uma fortuna. Período integral de uma creche de qualidade questionável custa o  que paguei na minha mensalidade de cinema na FAAP nos anos 2000. Imóvel próprio? Talvez um mini-apê na zona leste, ou um aluguel que consome 70% do salário.

Aqueles que foram atraídos por empresas 'boas de se trabalhar' com dia PET, sexta casual, direito a uma sala de lazer com sinuca, percebem seus chefes com uma plástica cordialidade, um sorriso esculpido em epóxi e horas extras estampadas debaixo de seus globos oculares. Está perdendo três horas do seu dia para ir e voltar da Faria Lima? Poxa, que tal pegar um patinete elétrico e se divertir no caminho? Que tal sair duas horas mais cedo de casa e fazer academia aqui do lado? Temos GymPass! Assim você passa menos tempo em casa e consome menos eletricidade. Nem vai perceber que mora em um apê de 25m². 

Esse falso cenário criado pelas empresas para continuar explorando o trabalhador está caindo por terra. Ninguém quer mais viver para trabalhar. Ninguém quer mais dar o número do seu celular particular para o chefe te encontrar a qualquer hora. 

O Influencer aparenta ter uma liberdade que muitos não conseguem atingir, presos pelas garras dos boletos e do status que precisam sustentar. Não parece razoável cortar pequenos luxos (uma marmita fit que economiza o tempo que você não tem porque está perdendo a hora de almoço, ou um happy hour de 200,00 por cabeça que você teme em perder e se tornar persona non grata entre os colegas). 

A ilusão do dinheiro, meus caros, compra o sonho de todos nós. De tacar o foda-se nas obrigações e viver do que realmente gostamos. Quem nunca quis mandar um cliente grosseiro a merda, mas se calou por conta do alto valor que ele estava pagando? Quanto vale a sua sanidade mental? Há trinta anos chamávamos isso de 'parte do jogo' e de 'fazer por merecer'. Ou seja, era um 'cala a boca' porque o pagamento falava mais alto. 

Mas a alma da sociedade mudou. Estamos mais imediatistas, individualistas e com uma cultura de merecimento (sem fazer por onde) que se sobrepõe aos antigos padrões. Você não pode me fazer sentir mal no ambiente de trabalho; você não pode gritar comigo; você precisa me pagar alto, pois sou especial e conheço meus direitos, eu tenho voz e bons advogados. Não toleramos mais chefes abusadores. 

A questão é que estamos vivendo um choque de gerações onde a fortuna parece ser a resposta mais rápida para uma vida livre de obrigações. Talvez fossemos mais tolerantes antigamente, talvez agora precisemos de mais respeito. Seja na geração dos anos 70 ou nessa que nasceu em 2010, a única constante é a do dinheiro como sinônimo de paz. Talvez ainda vamos precisar de mais três ou quatro gerações para mudar essa visão.

A profissão Influencer não está em alta. É o dinheiro que nunca saiu de moda.

E como dizia o mais sábio de todos: Não existe trabalho ruim. O ruim é ter que trabalhar. 

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