A Adaptação do Clássico Yu Yu Hakusho para a série da Netflix

 Yu Yu Hakusho está no coração de milhares de brasileiros que acompanharam as aventuras sangrentas e divertidas do detetive espiritual Yusuke Urameshi nas tardes da falecida TV Manchete nos anos 90.

Como eu, para aqueles que foram mais a fundo, o mangá lançado em 1990, trazia um protagonista um pouco mais “bad boy” que o anime suavizava.

Fui muito inspirada por essa geração de animes e mangás, me especializei em cinema, em roteiro e tive uma bela surpresa quando vi o seriado do Yu Yu Hakusho adaptado pela Netflix.

Claro que assisti.

Foram apenas cinco episódios que resumiram mais ou menos 60 episódios do anime.

Vou fazer uma análise baseada no meu entendimento de roteiro. Para quem já é meu aluno, vocês sabem que eu pego 3 pontos básicos para analisar uma história.

- Os personagens

- A ambientação

- E a trama em si.

 

Yu Hakusho é uma adaptação da adaptação. O primeiro foi os quadrinhos, os mangás, que foram adaptados para o anime, 116 episódios. E de 116 episódios, foram gerados esses 5 da Netflix. A produção com certeza não tinha grana para fazer uma adaptação linda, maravilhosa e perfeita como todos os fãs queriam.

O primeiro episódio da Netflix apresentou os personagens e o mundo que eles habitam: Japão, baixa renda, anos 90 (não aparece um celular na história inteira). Yusuke é apresentado como fumante. No mangá, o Yusuke fuma no começo da trama, complementando seu ar de bad boy e fazendo um aceno para o mangá.

É desenvolvido um argumento de que ele é incompreendido. Apesar de ser visto como encrenqueiro, ele salva os colegas com menos capacidade para se defender dos bullies e apenas se defende quando é ameaçado. Não busca briga.  A cena que ele morre é um negócio surreal, muito, muito bem feita.

Temos uma construção diferente da namorada do Yusuke, a Keiko, porque na verdade eles são amigos de infância e ela era a única pessoa que suportava ele no tempo dos bad boys, rola uma cumplicidade sem eles estarem juntos. E ela tem um desenvolvimento muito melhor como personagem na série da Netflix.

O Kuwabara se mostra um rapaz determinado e meio palhaço. O alívio cômico que se leva a sério demais – o que foi extremamente fiel ao mangá e ao anime.

A primeira luta - que não tem em nenhum outro lugar - é contra com o colega de classe do Yusuke (que é defendido no início) e é  nesse ponto que é possível entender o tom da história da Netflix. É bem diferente do que a gente viu desde os anos 90 porque o Yu Hakusho, apesar de ter lutas contra demônios é mais coloridinho, tem piadas, tem muita coisa que deixa o clima mais leve. O live-action mudou isso. Entra um clima zumbi na história, clima de terror. E aí percebe-se vai ser tudo bem escuro, bem dark.

Em contrapondo, tive um estranhamento na construção deste seriado. Por quê? O Yusuke continua com aquele uniforme verde, super claro, o Kuwabara continua com aquela roupinha azul. Aparece o Kurama com a roupa rosa, brilhante. A Botan, super fofinha de cabelo azul. Koema que (momento desabafo: meu, eu queria muito ver o Koema com aquela carinha de bebê, não a carinha de adulto, mas beleza. Era uma explicação extra que economizou tempo mostrar ele já adulto.) usa aquele cachecolzinho vermelho sobre a roupa azul...

E com aquela direção de arte colorida tentando se manter fiel à história original, porém com aquele clima dark em volta, ficou meio destoante, sabe?

No segundo episódio já temos a do Hiei e do Kurama. Apesar do CGI ser muito ruim, ruim mesmo, a luta é muito boa. Com coreografias de tirar o fôlego.

Entrando um pouco na análise da trama, vemos que logo no início do seriado existem os insetos demoníacos invadindo a cidade que é uma adiantamento no arco da segunda fase, onde Yusuke luta contra o Sensui.

E logo em seguida já temos o desenvolvimento do Kurama, a explicação do roubo do espelho pra poder curar a mãe e a questão do Hiei, que também foi suavizado, mostrando que seu objetivo maior era encontrar a irmã perdida.  Perdemos aqui a explicação mais profunda do sofrimento que ele passou para conseguir o terceiro olho, sendo que para a Netflix, bastou roubar a adaga demoníaca.

O único momento que realmente incomodou a fã em mim e eu não pude encontrar uma explicação técnica e plausível como roteirista, foi o resumo do arco do treinamento com a Mestre Genkai. Não gostei, para desenvolvimento do protagonista, o fato do Kuwabara ter ido junto treinar. Deu a impressão que ele merecia mais a posição de herdeiro dos poderes da Genkai que o próprio Yusuke.

O momento em que Genkai passa seu poder para o pupilo também foi resumido e corrido. Não teve aquele sofrimento dentro da caverna por horas e a mestra não morre nos braços do Yusuke após ser derrotada por Toguro.



Retornando a história principal, temos um mix do arco da Yukina (a irmã perdida de Hiei) e o arco do Torneio das Trevas. Saito, o idealizador do torneio virou o grande vilão psicopata da história, sem uma motivação clara a não ser apostar. No original, ele tinha alguns momentos ambíguos como o momento em que ele salva da Shizuko (irmã do Kuwabara, também suprimida) e rola meio que uns olhares estranhos lá no meio, uma curiosidade.

Para motivar Yusuke a encarar Toguro, ao invés de existir o Torneio das Trevas em um estádio cheio de times e Youkais, sequestram a Keiko e é ela quem encontra Yukina e as duas tentam escapar da fortaleza do Saito, dentro da Ilha que originalmente era o local do torneio.

Meu lado cineasta entende a adaptação por conta da falta de verba e o limite quase agonizante de 5 episódios para resumir 60 originais.  Não é possível preencher um estádio inteiro cheio de demônios em CGI e gastar muitas horas de roteiro pra poder construir um crescimento do Yusuke tanto moralmente como lutador até ele ter capacidade pra ganhar do Toguro. Foi apenas mostrado a luta principal com personagem.

O Kurama luta contra o Karasu e Hiei contra Bui que é quando mostra o ataque do dragão. No anime, Hiei demora muito para desenvolver esse golpe. Existe uma construção. Que também não mostra no live-action.

Kuwabara luta contra o Toguro mais velho, mas não o derrota. O que achei uma supressão desnecessária.

Chegamos na luta contra o Toguro, óbvio, e os mocinhos ganham, inclusive com a cena em que Toguro golpeia Kuwabara para que Yusuke desperte seus poderes.  

Um parênteses feminista: na história original, Keiko é só a mocinha indefesa que dá uns tapas no Yusuke de vez em quando, mas é essencialmente uma donzela em perigo. Ao tentar escapar junto com a Yukina, ela aplica um mata-leão em um dos guardas. Ela agradece Yusuke por ter mostrado alguns golpes a ela e, junto com a falta de apertos em peitos e bundas, foi uma boa mudança para que o relacionamento deles tivesse um equilíbrio melhor.

As cenas de luta estão ótimas, estão muito, muito boas mesmo, o desenvolvimento dos personagens está bom e aceitável.

Devorei os cinco episódios sem piscar. É sim uma boa adaptação com o que eles tinham disponível naquele momento. E eu espero que tenha uma segunda temporada.

 Se quiser ver o vídeo completo, me segue no Youtube e, se quiser aprender mais sobre cinema e roteiros, é só me seguir no Instagram 

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Meu Primeiro Castelo

Monster (2023)